Afroempreendedorismo no Brasil: os desafios e potenciais de um mercado diverso e crescente
O afroempreendedorismo brasileiro movimenta milhões de reais. É um setor pujante que abrange uma grande diversidade de pessoas e projetos. Mas, quando olhamos para o ecossistema de inovação no Brasil, embora ele esteja se desenvolvendo, é fácil perceber que os empreendedores negros não têm as mesmas oportunidades que os brancos.
Existe um problema claro: a falta de equidade nas relações entre os players. Infelizmente, o afroempreendedor ainda é marginalizado e tem dificuldade de acesso a esse ecossistema. E, quando consegue espaço nele, não há sensação de pertencimento. Vejo isso nos empreendedores com quem trabalho, cuja maioria tem um círculo de contatos extremamente limitado.
O empreendedorismo de inovação acaba sendo um reflexo da nossa sociedade como um todo. Existe uma desigualdade entre as oportunidades e o apoio que um empreendedor negro recebe e o que é oferecido a outros grupos – o que é bastante similar ao que a gente encontra em outros campos de atuação.
No momento em que comecei a empreender, em 2004, o ecossistema brasileiro não era tão robusto quanto hoje e não havia tantas pessoas negras. Mas atualmente existe um avanço crescente no setor e esse foi um dos pontos que me levou a ser um investidor-anjo. A iniquidade de acesso dentro do ecossistema estava criando uma oportunidade comercial. Grandes projetos estavam sendo subvalorizados por serem encabeçados por negros e, consequentemente, eram invisíveis para o mercado de investimento de capital de risco.
Isso está dentro de um termo que chamo de “maiorias desprivilegiadas”, que se aplica bem ao Brasil. Você tem grupos sociais, como mulheres, negros, pessoas de baixa renda, que representam a maioria da população, mas que são desprivilegiadas dentro de contextos sociais, incluindo o ecossistema de inovação. Justamente por serem subvalorizadas, elas se tornam uma oportunidade para os investidores que conseguem enxergar o potencial dessas empresas antes do resto do mercado.
Quando se fala em empreender no Brasil, o contexto nem sempre é animador. Uma enorme parcela dos profissionais que empreendem atualmente no país o faz por sobrevivência, não por oportunidade – o que é ainda mais comum entre a população negra.
Muito por causa dessa visão, é cobrado do afroempreendedor que seu negócio tenha um propósito social escancarado. Particularmente, eu acho que todos deveriam se preocupar em causar um impacto social positivo, mas isso acaba sendo um peso desnecessário para os empreendedores negros que já enfrentam muitas dificuldades para começar. Essa acaba sendo mais uma categorização com a qual eles têm que lidar. É um reflexo da situação racial do Brasil, em que se espera que o negro preencha um certo tipo de papel predestinado a ele. Isso interfere no ecossistema e impede que grande projetos sejam desenvolvidos por essas pessoas.
Outro ponto importante é que ainda existe um distanciamento muito grande entre os players. Existem comunidades de negros, de mulheres, de homens brancos héteros – que é a hegemônica –, e todas estão separadas. Precisamos organizar melhor o ecossistema de forma geral para construirmos uma rede mais homogênea, próxima e aberta às diferenças. Muitas empresas vão se beneficiar com essa diversidade e troca de experiências.
Nos últimos três anos, houve bastante interesse em dialogar, mas sempre achei que faltava um evento para chacoalhar o ecossistema e sacudir o setor de venture capital no Brasil no que tange a diversidade. Tenho a esperança de que o Black Founders Fund gere esse impacto que estamos aguardando há tempos no mercado tradicional.
Eu tive a oportunidade de trabalhar um tempo no Vale do Silício e ali você não encontra um espaço geográfico, mas sim um estado de espírito onde a sinergia move tudo. Muitas vezes se diz que um mais um nunca é dois dentro desse ambiente, acaba sendo três, quatro ou cinco. Precisamos desenvolver um pouco dessa visão. As empresas precisam entender que quando uma tem sucesso, ela impacta positivamente as outras. Quanto mais a gente conseguir cooperar uns com os outros, melhor o ecossistema fica.
Neste momento, ainda existe distância e pouca comunicação verdadeira, mas acredito que é possível alcançarmos um estágio onde haja mais integração e equidade. Para isso, é preciso que todos assumam a sua parte. É mais do que urgente criar coletivamente a consciência de que nós, negros, não queremos criar uma economia separada, mas sim uma economia inclusiva. Nessa luta, somos todos aliados.
Saiba mais sobre o Black Founders Fund Brasil